Por Tonio Luna e Angelo Horst
Algumas vezes recebo e-mails de estudantes de Psicologia com dúvidas sobre a profissão. Especialmente alguns parecem mais idealistas, no melhor sentido da palavra. Seguem abaixo as conversas eletrônicas de um deles que prendeu muito minha atenção, em um momento de decisão de nossa conversa. Minhas perguntas têm, como sempre, a intenção de provocar algum movimento.
PSILVA - Política e cidadania são a mesma coisa, em línguas diferentes. Por que falar nisto ao invés de copa e futebol?ANJO - Talvez porque, ganhando ou perdendo a copa, durante os próximos quatro anos iremos discutir futebol. Cidadania? Talvez voltemos a falar dela somente daqui há dois anos. Se fôssemos políticos, com a mesma intensidade que somos técnicos de futebol, cidadania não precisaria ser ensinada na escola.PSILVA - Será esta escolha uma questão de prazer, ou seja, escolho o futebol por que é mais fácil? Mas a política, no bom e mau sentido, também influencia o futebol não é?ANJO - Afinal, se perdermos a copa, a culpa é do Dunga. Se perdermos quatro anos politicamente, a culpa é de quem? Ninguém quer carregar esse fardo, ninguém quer ser responsável. E mais importante do que a política influenciar o futebol é não deixar esta ser influenciada por ele.PSILVA - Mas futebol não é esporte, não é saudável?ANJO - E muito! Sobretudo para quem pratica. Uma política saudável requer atuação, como uma equipe unida. Se não quisermos nos tornar sedentários de direitos, precisamos “correr atrás da bola”. Torcer é importante, mas não o suficiente. Se fosse assim, teríamos ganho todas as copas do mundo...PSILVA - Acho que você se aproveita do fato de ser estudante para dar uma resposta tão pouco psicológica. Onde está a Psicologia nisto?ANJO - Como terapeuta, pensei que você fosse capaz de reconhecê-la nas entrelinhas. Ou a tua Psicologia limita-se aos quatro cantos de seu consultório e às “faltas cometidas” pelos teus pacientes?PSILVA - Ah, há quanto tempo a Psicologia fica como algo reconhecido nas entrelinhas. Chega de marginalidade, de espaços imaginários, de lugares seguros e defendidos pelos pensamentos. Isto sim é limitar algo em quatro quantos! Não está na hora de se explicitar o que se quer?ANJO - Que sejamos agentes de mudança e não, como no futebol, apenas meros expectadores da política e da Psicologia. O verdadeiro cidadão é aquele que se reconhece como parte das decisões políticas de seu país e, principalmente, dos rumos de sua profissão ano a ano, dia após dia.PSILVA - Uma resposta política, esta, a sua. Quando não sabe o que responder ou não quer se comprometer, usar obviedades. Que tal ser mais sincero e me responder a pergunta anterior?ANJO - Conferências, Mobilizações contra o PL do Ato Médico, Pré-Congressos, Congresso Regional de Psicologia, Congresso Nacional, Eleições no CRP, para citar alguns. Quantas oportunidades destas você aproveitou?PSILVA - Aproveitei-as todas e juntei um monte de certificados. O que seria aproveitar oportunidades em sentido pleno?ANJO - Não desmereça aqueles que, diferente de você, buscam mais do que “juntar” certificados. Eles encontram sentido pleno ao perceberem que seus certificados não têm relevância se os rumos de tua profissão e de teu país forem os piores.
A partir deste ponto a correspondência ficou deliciosamente impublicável e pessoal. Sei que encontrei um futuro psicólogo que, descendo dos céus, terei orgulho de ter como colega de profissão.
Agradeço ao estudante de Psicologia Angelo Horst por dar vida a este texto.
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Ilustração: Ademir Paixão |
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