terça-feira, 16 de abril de 2013

na volta pra casa

É na volta pra casa e no fundo do circular que busco o protagonista deste texto. Trata-se de um sujeito de paletó, calça social, gravata vermelha, sapato preto e que carrega consigo uma caixa de papelão recheada de batatas-doces. Aparenta meia-idade e procura incansavelmente algo guardado ou perdido nos bolsos internos do paletó. Seu desconforto com o traje é visível e o desajuste das peças em seu corpo também. 

Afinal, o que procura? Em época de segregação social aguçada, vale a pena refletir se é mais prudente se autotransformar em herói ou, simplesmente, vítima. São tantas as que padecem e padeceram pela falta dos primeiros que em algum momento pode ser útil se perguntar o que podemos fazer por elas ou para evitá-las. 

Enquanto a resposta não vem o sujeito continua ali, aflito. Olha atento ao redor e retira do bolso da calça um lenço de papel. Limpa os lábios com cuidado, seca o suor que escorre pela testa e, num ritual de adoração, lustra seu livro preto de capa grossa e inscrição dourada, antes imerso na caixa junto às batatas-doces. Pelo bem ou pelo mal, o risco iminente causado pelo consolo que qualquer fanatismo oferece ao fanático dessa vez não o autorizou a fazer mais nada além do que somente apertar o botão de parada, esperar as portas se abrirem e desembarcar no próximo ponto.

16/abril-2013

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